#026 | Série: O intervalo entre um pensamento e outro
Capítulo 1: O que habita no intervalo entre um pensamento e outro
Há uma arquitetura invisível dentro de nós. Não feita de tijolos ou sinapses, mas de pausas. Uma espécie de templo improvisado que só se revela quando deixamos de tentar entender o mundo a qualquer custo.
Nos ensinaram que pensar é existir, mas talvez esquecer de pensar às vezes seja sobreviver. Ou melhor: viver.
Nosso cérebro, tão celebrado, é um engenheiro pragmático. Ele constrói atalhos. Categoriza o que vê, prediz o que pode acontecer, julga, decide, age. Tudo isso em milissegundos. Isso nos manteve vivos nas savanas e nos mantém funcionais nas cidades. Mas esse mesmo cérebro que corre para solucionar uma equação social, raramente para para olhar o céu sem buscar constelações.
A contemplação é um desvio mas um desvio sagrado. Um desvio que abre clareiras no concreto do cotidiano.
Quando deixamos de operar o mundo como um problema a ser resolvido, algo muda na nossa presença. É como se deslizássemos da superfície para as camadas mais fundas do ser. Aquelas onde o nome das coisas não importa, e onde o silêncio começa a fazer sentido.
Pensar é bom. Mas há coisas que não se pensam se percebem. E há sentimentos que só se revelam quando não estamos tão ocupados tentando entendê-los. São como peixes tímidos que fogem ao primeiro movimento brusco. Para vê-los, é preciso ficar quieto, muito quieto, à beira do lago.
Talvez a verdadeira sabedoria não esteja em entender tudo, mas em saber quando parar de tentar entender. Criar dentro de nós esse intervalo macio entre um pensamento e outro, onde as certezas perdem importância e as perguntas respiram melhor.
É nesse intervalo que a vida, às vezes, sussurra algo que ainda não tem palavras. E, talvez, nunca terá.